Encontro 04 de Abril de 2024

O foco da aula de hoje foi a câmera lenta: um exercício proposto por Hugo Rodas que consiste basicamente em realizar todo e qualquer movimento corporal de maneira extremamente lenta, tão lenta quanto "o nascer do sol" ou "o desabrochar de uma flor".

Essa é a base da técnica muscular no sentido de ser um exercício fundamental para compreender experiencialmente a abordagem sensível desta técnica. 

Como desenvolvi na minha dissertação de mestrado (CAFÉ, 2014)  a sensibilidade na técnica muscular consiste principalmente em estar permeável à tudo que ocorrer em cena e ser capaz de reagir aos acontecimentos em tempo real de maneira criativa. O exercício da câmera lenta ajuda muito neste quesito, pois quando realizamos um exercício de maneira tão lenta fica muito difícil executar ordens mentais e somos forçados a experienciar e jogar com o momento presente. Em outras palavras, caso alguém queira, por exemplo, colocar as mãos, que estavam nos bolsos da calça, na cabeça em câmera lenta, será muito difícil realizar esta ação apenas, pois como o tempo é dilatado um simples gesto de retirar as mãos dos bolsos e colocar na cabeça pode levar de 5 à 10 minutos. Ora, em 10 minutos cênicos muitas coisas acontecem tanto internamente quanto externamente ao ator que podem interferir na sua ação: ele pode sentir uma coceira no peito, um cachorro ao longe pode latir desviando sua atenção, um novo personagem pode aparecer em cena, etc. Assim, o ator em estado sensível e, portanto, permeável será atravessado por essas intervenções e terá que alterar seu gesto inicial seja mudando sua trajetória, sua intenção ou a tônica muscular da sua ação. Esse mesmo acontecimento pode ocorrer inúmeras vezes em 10 minutos enriquecendo a cena e preenchendo o seu gesto de diversas camadas interpretativas. Assim, um simples gesto que, num andamento normal, seria corriqueiro ganha na câmera lenta um preenchimento muito mais rico de afetos e significados. 

Essa habilidade de preenchimento da ação desenvolvida na câmera lenta pode em seguida ser aplicada para os outros andamentos (natural, rápido, rapidíssimo, etc.) enriquecendo-os no processo. Assim, do ponto de vista do treinamento, a câmera lenta serve como um mecanismo para aprimorar a qualidade de movimentação e a conexão afetiva do intérprete tanto consigo mesmo quanto com o seu ambiente. Já do ponto de vista da cena, ela não só permite um maior diálogo entre os intérpretes - pois dá o tempo para que as ações de todos os envolvidos sejam compreendidas por cada um - como também serve para dar preenchimento afetivo e de significado à ações inicialmente corriqueiras do intérprete.

Referência: 

CAFÉ, Flávio. O QUE APRENDI COM MEU MESTRE: Mapeamento dos princípios técnicos utilizados por Hugo Rodas. Dissertação de Mestrado: Universidade de Brasília, 2014.

Seguem abaixo os vídeos de registro da aula:

Parte 1:

https://www.youtube.com/watch?v=gZMUa3E0xec

Parte 2:

https://www.youtube.com/watch?v=_5U8SJ003cA

Parte 3:

https://www.youtube.com/watch?v=zuY-gbc205c

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Encontro do dia 03 de Setembro de 2024